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ESPECIAL HALLOWEEN – O Homem do Bosque

Eu não sou uma pessoa má, só estou livrando o mundo das probabilidades inevitáveis. Algo que eu mesmo senti na pele. Não sei até que ponto a mulher deitada em meu quarto preferido é inocente. Seu nome já disse tudo o que preciso saber.

 

Termino de arrumar meus instrumentos e entro no quarto. Ela me observa com os olhos arregalados e vermelhos. Isso me diverte.

 

– Tenha paciência querida Íris. – Sorrio de forma sedutora. – Não vou demorar.

 

Ela está anestesiada apenas do pescoço para baixo, e amordaçada para evitar ruídos indesejados. Minha profissão me deixa tão orgulhoso.

 

Me aproximo e coloco os objetos sobre a mesa ao lado da cama.

 

– Acho que não me apresentei corretamente, minha flor. Dr. Eduardo Richer, muito prazer! – Estendo minha mão na direção dela, só pelo prazer de mostrar que ela não pode fazer o mesmo. – Oh! Desculpe meu lapso, me esqueci que você não pode se mexer.

 

Lágrimas escorrem pelas têmporas, mas em vez de me comover elas me deixam mais animado pelo que vem a seguir.

 

Continuo com a brincadeira de apresentação:

 

– Sou neurocirurgião, sabia? Imagine que hoje mesmo salvei a vida de um homem. Não é irônico, pequena Íris? – Levanto minhas mãos e admiro-as. Respiro fundo ao constatar o poder que elas detêm.

 

Íris se comunica comigo através dos olhos, e percebo que os sentimentos se alternam dentro dela, ora um medo aterrador, ora ódio mortal. E eu gosto muito dos dois.

 

Alguns sentem prazer fumando um cigarro, bebendo uma cerveja, fazendo sexo e até mesmo indo a uma academia. Meu maior prazer é olhar para os olhos apavorados das mulheres que decidiram, por conta própria, se encontrar comigo. Elas fizeram exatamente o oposto do que a nossa maldita sociedade politicamente correta diz para fazerem.

 

Eu tenho pena da pobre Íris, mas isso não me impedirá de matá-la.

 

Por outro lado, tenho raiva dela. Não sei se Íris é casada, tem namorado ou se é tão solitária quanto eu. Mas ela é mulher, um dia teria um namorado, se casaria e o trairia.

 

Ando até a mesa onde meus instrumentos cirúrgicos estão.

 

– Sabe Íris, você tem sorte por eu conhecer profundamente a ciência e a arte da anestesia. Você não pode se mexer mas consegue ver tudo. Eu não ia deixar você dormir o tempo todo. Você tem direito de ver o que vai lhe acontecer, não é mesmo?

 

– Você é muito bonita pequena flor. Gosto dos seus olhos amendoados, dos seus cabelos negros e ondulados. Gosto mesmo. Mas agora preciso começar.

 

Volto para perto dela com o bisturi na mão. Seguro primeiro os dedos do pé. Olho para ela. Obrigado, você está perfeita. Seus resmungos ininteligíveis soam como a Nona Sinfonia de Beethoven. A mesma que está tocando agora, a mesma que tocou em meu casamento com Hortência alguns anos antes e a mesma que tocou quando a fiz desaparecer.

 

Corto o primeiro dedo. O sangue esguicha. Seus pés não se movem, sua cabeça balança de um lado para o outro em desespero. Eu sabia que isso aconteceria. Cortar os dedos de Íris não tem qualquer outra utilidade, senão causar pânico.

 

Sorrio para a pequena flor, que agora tem certeza do fim que a espera. Faço um torniquete em seu tornozelo e cauterizo o lugar com o maçarico manual. Repito a operação em todos os dedos, sempre olhando para os olhos dela. Consigo ver a aflição emanando deles como raios palpáveis.

 

– Eu sei que prometi não demorar, mas não resisti. Me desculpe. – Sorrio novamente para ela.

 

Depois de cortar todos os dedos, guardo-os para juntá-los ao resto do corpo mais tarde.  Volto minha atenção à Íris.

 

– Agora você tem certeza de que já está morta, não é mesmo, minha Íris? Mas fique acordada, senão perderá o melhor da festa.

 

Caminho para fora do quarto. Acendo o imenso forno que fica no fundo do quintal, perto das árvores do bosque.

 

Volto para o quarto. Começo a cortar as pálpebras da garota, mas ela gira a cabeça – única parte não imobilizada de seu corpo. – Sou obrigado a prender sua cabeça para terminar o trabalho. Enquanto corto aquela pele ela me olha suplicante, lágrimas e sangue escorrem sem parar pela sua face corada. Sei que parece cruel, mas quero-a com os olhos bem abertos. Não queremos que ela perca a visão da porta do inferno.

 

Levo-a para fora, em direção ao forno.

 

– Chegamos, minha querida. A festa está acabando. Sentirei sua falta.

 

Antes de colocá-la no forno observo-a novamente, e digo:

 

– Foi um grande prazer conhecê-la. É uma pena que não possa me dizer o mesmo. Mas estou vendo o tamanho de sua satisfação estampada em cada parte de seu corpo.

 

Ela derrama lágrimas compulsivamente. Seus grunhidos aumentam na mesma proporção. Como deve ser olhar de frente para a fogueira que vai te queimar?

 

Espero que Íris vire cinzas. Recolho tudo. Vou até o bosque e deposito o que restou dela no buraco previamente aberto. Minha flor tinha uma luz intensa, e por isso a muda que preparei para ela é de uma linda Íris de cor amarela.

 

Agora que tudo acabou, sento-me na varanda, com uma caneca de chá quente nas mãos, e fico a admirar o meu pequeno bosque enfeitado por minhas lindas flores: Íris, Hortência, Violeta, Margarida e mais algumas. Ainda tem espaço para preencher aqui.

 

Talvez eu procure alguma rosa para enfeitar o meu jardim.

­­

 

– Estamos num beco sem saída – digo ao meu subordinado. – Não consigo ver qualquer conexão entre os desaparecimentos. Parece um labirinto sem escapatória.

 

– Talvez as mulheres simplesmente foram embora, senhor Eduardo.

 

– Preciso que continuem investigando.

 

– O senhor é quem manda, chefe.

 

Ele sai da sala. Recosto a cabeça na minha poltrona confortável. Acho que vou acender um charuto.

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